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Pensando com Caio Prado Jr





Caio Prado Júnior (1907-1990) foi um intelectual marxista, com uma longa trajetória de atuação no PCB. Filiou-se ao partido comunista em 1931 e em pouco tempo destacou-se como dirigente político, nesta época atuando principalmente na Aliança Nacional Libertadora (ANL), espécie de frente de oposição ao governo de Vargas lançada em 1935. Com a eclosão, neste mesmo ano, da Intentona Comunista (tentativa de revolução liderada pelos comunistas), Caio Prado Júnior foi preso, ficando na prisão de 1935 a 1937. De onde parte para viver a II Guerra Mundial na Europa.
Com fim da ditadura de Getúlio Vargas, Caio Prado volta à política e é eleito deputado estadual pelo PCB para a Assembleia Legislativa de São Paulo, em 1946, porém, no ano seguinte, seu mandato é cassado, em virtude do Partido Comunista ter sido colocado na ilegalidade pelo governo Dutra (1946-1951), obedecendo com isso às imposições dos Estados Unidos, que dava início as hostilidades da Guerra Fria.
Durante os anos 1950 e 1960, Caio Prado Júnior procurou, em sua atuação no interior do PCB, combater a teoria e a prática tão difundida entre os comunistas da época de que a revolução no Brasil ainda teria um “caráter democrático-burguês”, ou seja, segundo o entendimento do PCB naquela época, a luta no Brasil ainda não era pelo socialismo, mas sim por uma revolução contra o latifúndio e contra o imperialismo, que o operariado deve levar a cabo numa aliança com a burguesia nacional.
A estratégia do PCB baseava-se uma leitura da História do Brasil segundo a qual o país ainda não seria uma sociedade plenamente capitalista, devido ao predomínio da agricultura sobre a indústria na economia brasileira, por isso enquadrava-se muito mais na categoria de país semifeudal, que carecia ainda de uma revolução burguesa. Portanto, somente a superação do latifúndio e do imperialismo desbloquearia o desenvolvimento do capitalismo no Brasil, colocando com isso a revolução socialista na ordem do dia. Daí, a política do PCB, nos anos 1950-1960, ter se direcionado especialmente para a luta pela reforma agrária no país, que poria fim aos tais “restos feudais”.
Neste contexto, em que o PCB seguia a risca as orientações e os esquematismos propostos pela União Soviética, a atuação de Caio Prado Junior caracterizou-se por uma postura de autonomia intelectual e de dissidência política no interior do partido. Caio Prado discordava destas teses defendidas pelo PCB e procurou demonstrar a fragilidade delas em vários de seus trabalhos, como, por exemplo, em Formação do Brasil contemporâneo (1942) e A Revolução Brasileira (1966), nos quais se dedicou principalmente aos estudos históricos de onde retirava argumentos para o debate político.
De acordo com sua visão do processo de formação da sociedade brasileira, Caio Prado procurou demonstrar como que a colonização portuguesa era um capítulo da expansão comercial da burguesia europeia, por isso inevitavelmente ligada ao processo de formação da economia capitalista. Na verdade, a colonização foi um processo subordinado aos interesses da burguesia europeia, que estava em busca de produtos que pudessem ser comercializados com altos lucros no mercado mundial, objetivos que só podiam ser atingidos mediante um processo produtivo calcado num trabalhador altamente explorado, que não podiam ser senão um trabalho escravo.
Portanto, a formação do Brasil estaria submetida a uma dupla determinação: uma externa, caracterizada pela subordinação do país a economia mundial, e outra interna, advinda das relações escravistas de produção. Deste modo, Caio Prado Júnior fugia dos esquematismos advindos do stalinismo, para desenvolver uma reflexão voltada principalmente para a compreensão das particularidades da formação histórica do Brasil, com base na qual deveria se erigir uma estratégia para a revolução brasileira.






Refutando a teoria dos “restos feudais”, Caio Prado refuta também a política da “revolução democrático-burguesa”, defendendo, portanto, a atualidade da revolução socialista para a realidade brasileira. Daí que a luta política no Brasil deveria ser, segundo Caio Prado, não pela partilha da terra e sim onde “se encontram os pontos nevrálgicos do processo revolucionário em curso. A saber, a luta reivindicatória dos trabalhadores rurais por melhores condições de trabalho e emprego.” Para Caio Prado, a revolução brasileira tratava-se de generalizar os direitos trabalhistas para os trabalhadores rurais, de organizar sindicatos, enfim, via na luta direta pela terra uma questão residual, que não devia ser posta à frente de uma luta por reformas nas relações de trabalho, que terminasse, por assim dizer, a tarefa abolicionista, pondo fim a super exploração do trabalhador brasileiro. Observe, portanto, que para Caio Prado, não existem restos feudais no Brasil e sim uma herança da escravidão.
Por mais polêmicas que tenham sido as posições de Caio Prado, uma virtude o singulariza em relação a muitos: o seu marxismo tem uma profunda raiz na história nacional, pela interpretação do Brasil passavam todas as controvérsias que ele ofereceu ao pensamento comunista brasileiro por quase meio século, de modo que a própria ideia de política comunista é sempre pensada a partir da compreensão do conjunto da formação social brasileira em sua especificidade.
Entre os anos de 1955 e 1964, foi editor da Revista Brasiliense, onde desempenhou um importante papel na divulgação e renovação do ideário marxista-comunista no Brasil. Só para se ter uma ideia, foi nesta revista que apareceram as primeiras traduções de textos de Georg Lukács, Lucien Goldmann, Antonio Gramsci, entre outros autores dissidentes da ortodoxia stalinista.
Enfim, Caio Prado foi um intelectual militante que nunca se afastou do partido, procurando reunir teoria e prática em torno se sua luta no PCB. Sua obra tinha em vista servir à luta de classes e à revolução socialista no Brasil. A herança de Caio Prado Júnior para o pensamento comunista deve ser identificada na preocupação com especificidade da formação social brasileira e na importância da democracia para a política comunista.

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