MILTON SANTOS - A trajetória e o reconhecimento
Embora pouco conhecido fora do meio acadêmico, Santos alcançou reconhecimento fora do país, tendo recebido, em 1994, o Prêmio Vautrin Lud (conferido por universidades de 50 países).
Sua obra O espaço dividido, de 1979, é hoje considerada um clássico mundial, onde desenvolve uma teoria sobre o desenvolvimento urbano nos países subdesenvolvidos.
Suas ideias de globalização, esboçadas antes que este conceito ganhasse o mundo, advertia para a possibilidade de gerar o fim da cultura, da produção original do conhecimento - conceitos depois desenvolvidos por outros. Por uma Outra Globalização, livro escrito por Milton Santos dois anos antes de morrer, é referência hoje em cursos de graduação e pós-graduação em universidades brasileiras. Traz uma abordagem crítica sobre o processo perverso de globalização atual na lógica do capital, apresentado como um pensamento único. Na visão dele, esse processo, da forma como está configurado, transforma o consumo em ideologia de vida, fazendo de cidadãos meros consumidores, massifica e padroniza a cultura e concentra a riqueza nas mãos de poucos.
Espaço: abordagem inovadora
A obra de Milton Santos é inovadora e grandiosa ao abordar o conceito de espaço. De território onde todos se encontram, o espaço, com as novas tecnologias, adquiriu novas características para se tornar um "conjunto indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ações".
As velhas noções de centro e periferia já não se aplicam, pois o centro poderá estar situado a milhares de quilômetros de distância e a periferia poderá abranger o planeta inteiro. Daí a correlação entre espaço e globalização, que sempre foi perseguida pelos detentores do poder político e econômico, mas só se tornou possível com o progresso tecnológico. Para contrapor-se à realidade de um mundo movido por forças poderosas e cegas, impõe-se, para Santos, a força do lugar, que, por sua dimensão humana, anularia os efeitos perversos da globalização.
Estas ideias são expostas principalmente em sua obra A Natureza do Espaço (Edusp, 2002).
No conceito de espaço, Milton Santos revela a noção de paisagem, onde sua forma está em objetos naturais correlacionados com objetos fabricados pelo homem. Santos aponta que espaço e paisagem não são conceitos dicotômicos, onde os processos de mudança social, econômico e político da sociedade resultam na transformação do espaço, que concatenado a paisagem se adaptam para as novas necessidades do homem naquele dado período. Milton Santos revela o conceito de paisagem como algo não estanque no espaço, e sim que a cada período histórico altera, renova e adapta para atender os novos paradigmas do modo de produção social.
São ideias apontadas na obra "Pensando o espaço do homem" São Paulo: Hucitec, 1982.
Biografia
Milton Almeida dos Santos nasceu em 3 de maio de 1926 e faleceu em São Paulo, 24 de junho de 2001. Foi geógrafo, apesar de ter se graduado em Direito. Ele destacou-se por seus trabalhos em diversas áreas da geografia, em especial nos estudos de urbanização do Terceiro Mundo. Foi um dos grandes nomes da renovação da geografia no Brasil ocorrida na década de 1970.
Milton Santos nasceu no município baiano de Brotas de Macaúbas em 3 de maio de 1926. Ainda criança, migrou com sua família para outras cidades baianas, como Ubaitaba, Alcobaça e, posteriormente, Salvador. Em Alcobaça, com os pais e os avós maternos (todos professores primários), foi alfabetizado e aprendeu álgebra e a falar francês.
Aos 13 anos, Milton dava aulas de matemática no ginásio em que estudava, o Instituto Baiano de Ensino. Aos 15, passou a lecionar Geografia e, aos 18, prestou vestibular para Direito em Salvador. Enquanto estudante secundário e universitário marcou presença na militância política de esquerda. Formado em Direito, não deixou de se interessar pela Geografia, tanto que fez concurso para professor catedrático no Colégio Municipal de Ilhéus. Nesta cidade, além do magistério desenvolveu atividade jornalística, estreitando sua amizade com políticos de esquerda. Nesta época, escreveu o livro Zona do Cacau, posteriormente incluído na Coleção Brasiliana, já com influência da Escola Regional francesa.
Em 1958, concluiu seu doutorado na Universidade de Estrasburgo, na fronteira da França com a Alemanha. Ao regressar ao Brasil, criou o Laboratório de Geomorfologia e Estudos Regionais, mantendo intercâmbio com os mestres franceses. Após seu doutorado, teve presença marcante na vida acadêmica, em atividades jornalísticas e políticas de Salvador. Em 1961, o presidente Jânio Quadros nomeia-o para a subchefia do Gabinete Civil, tendo viajado a Cuba com a comitiva presidencial - o que lhe valeu registro nos órgãos de segurança nacional após o golpe de 1964.
Exílio
Em função de suas atividades políticas junto à esquerda, Milton foi perseguido pelos órgãos de repressão da ditadura militar. Seus aliados e importantes políticos intervieram junto às autoridades militares para negociar sua saída do país, após ter cumprido meio ano de prisão domiciliar. Milton achou que ficaria fora do país por seis meses, mas acabou ficando 13 anos. Milton começa seu exílio em Toulouse, passando por Bordéus, até finalmente chegar a Paris em 1968, onde lecionou na Sorbonne, tendo sido diretor de pesquisas de planejamento urbano no Institut d'Étude du Développement Économique et Social (IEDES).
Permaneceu em Paris até 1971, quando se mudou para o Canadá. Trabalhou na Universidade de Toronto. Foi para os Estados Unidos, com um convite para ser pesquisador no Massachusetts Institute of Technology (MIT), onde trabalha com Noam Chomsky. No MIT trabalha em sua grande obra O Espaço Dividido. Dos EUA viaja para a Venezuela, onde atua como diretor de pesquisa sobre planejamento da urbanização do país para um programa da ONU. Neste país manteve contato com técnicos da Organização dos Estados Americanos, o que facilitou sua contratação pela Faculdade de Engenharia de Lima, onde foi contratado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) para elaborar um trabalho sobre pobreza urbana na América Latina.
Posteriormente, foi convidado para lecionar no University College de Londres, mas o convite ficou apenas na tentativa, já que lhe impuseram dificuldades raciais. Regressa a Paris, mas é chamado de volta à Venezuela, onde leciona na Faculdade de Economia da Universidade Central. Segue, posteriormente para Tanzânia, onde organiza a pós-graduação em Geografia da Universidade de Dar es Salaam. Permaneceu por dois anos no país, quando recebeu o primeiro convite de uma universidade brasileira, a Universidade de Campinas. Antes disso, regressa à Venezuela, passando antes pela Universidade de Colúmbia de Nova Iorque.
Retorno ao Brasil
No final de 1976, houve contatos para a contratação de Milton pela universidade brasileira, mas não havia segurança na área política e o contato fracassou. Em 1977, Milton tenta inscrever-se na Universidade da Bahia, mas, por artimanhas político-administrativas, sua inscrição foi cancelada. Ao regressar da Universidade de Colúmbia iria para a Nigéria, mas recusou o convite para aceitar um posto como Consultor de Planejamento do estado de São Paulo e na Emplasa. Esse peregrinar custou-lhe muito, mas sua volta representou um enorme esforço de muitos geógrafos, destacando-se Armen Mamigonian, Maria do Carmo Galvão, Bertha Becker e Maria Adélia de Souza. Quanto ao seu regresso, Milton tinha um grande papel nas mudanças estruturais do ensino e da pesquisa em Geografia no Brasil.
Após seu regresso ao Brasil, lecionou na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) até 1983. Em 1984 foi contratado como professor titular pelo Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP), onde permaneceu mesmo após sua aposentadoria. Também lecionou geografia na Universidade Católica de Salvador.
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